Ao contrário do que aprendíamos na escola até meados do século 20 – a verdade, sempre a verdade – vivemos na atualidade na contramão daquela velha sentença que servia de esteio à maioria das famílias, não importasse sua classe social. Rico ou pobre, nos acostumamos ao respeito à verdade, e sempre a preferíamos do que mentir, assumindo as consequências. Hoje, mentir é tão banal que grandes mentiras parecem brincadeirinhas infantis. Principalmente pelo recurso político à mentira como forma de demonstração de que um ato ou decisão legal tem o caráter contrário ao pretendido.
O exemplo da chamada reforma fiscal nos mostra isso claramente. Boa parte da sociedade onde a política fiscal pesa bastante tem se manifestado favorável àquela que se encontra no Congresso Nacional por iniciativa governamental. Ela vai melhorar a carga fiscal, exageradamente grande no Brasil, onde chega a consumir cerca de 38% da renda nacional. Preocupado com tantos e variados impostos, que chegam a exigir das empresas uma Diretoria especial ou um caro departamento pelo volume de especialistas nessa matéria, vamos simplificar o sistema tributário, limitando a dois grupos nossa arrecadação fiscal. Dito desta maneira, ganhou simpatia na opinião pública o aparentemente simpático projeto governamental, que parece induzir a uma sonhada diminuição de impostos.
Nada mais enganoso.
Aqui abordamos apenas dois aspectos, o do controle dos gastos públicos e o de interesse de um dos mais importantes setores da economia, o turismo. No controle dos gastos públicos, nada mais enganoso. Fecham-se algumas torneiras do desperdício, mas a grande válvula de escape continua aberta, pela via do endividamento do governo. Basta, por exemplo, que ele lance títulos públicos e os entoche (v. o tamanho da dívida pública) nos bancos, onde cerca de dois terços dos depósitos estão bloqueados.
No segundo caso, basta ver o protesto no manifesto de cerca de uma dezena de entidades representativas, das quase 60 que compõem a indústria do turismo, para se ter uma ideia de como isso vai meter a mão no bolso de quem trabalha pelo Brasil. Encabeçado por entidades respeitadas como a ABAV, ABIH, ABEAR, ABEOC, ABRACORP, BRAZTOA, FBHA e AVIRP, ele salta de 8,65% para 25% os impostos incidentes no trabalho turistico. Enquanto países que entendem a importância do turismo para a geração de empregos e renda para seu povo, a França, Espanha, Inglaterra e muitos outros, aplicam uma tarifa média de 10%, vamos taxar a atividade em 25%. ``Mas turismo é laser de ricos``, disse um assessor governamental semana passada. Ele parece desconhecer que no Brasil o turismo como atividade econômica significa 8,1% do PIB Nacional e gera 7,4 milhões de empregos diretos.
Por isso, ao contrário da piada onde o leão escapa da jaula no circo, cuidado, o leão é bravo, e uma mordida dele pode arrancar seu braço ou sua perna.
Hélcio Estrella
Ex Presidente Nacional da Abrajet, Ex presidente da Abrajet São Paulo Diretor e colunista · Revista financeira Banco Hoje
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